
Ministro aponta cerceamento de defesa, diverge de Moraes e Dino e fornece peça de propaganda sob medida para Trump – Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil
O ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), votou nesta quarta-feira, 10, pela anulação da ação penal que investiga uma suposta trama golpista para manter Jair Bolsonaro no poder após a derrota nas eleições de 2022.
Fux acatou a tese de cerceamento de defesa apresentada pelos advogados, divergindo dos ministros Alexandre de Moraes, relator do caso, e Flávio Dino, que rejeitaram todas as preliminares levantadas.
Segundo o ministro, o imenso volume de provas entregues às defesas — mais de 70 terabytes de dados — e o prazo reduzido para análise comprometeram a ampla defesa. “Apenas em meados de maio, cerca de cinco dias antes do início da oitiva das testemunhas, a Polícia Federal enviou links de acesso para as defesas. Como se não bastasse, novos arquivos foram incluídos no curso da instrução processual – inclusive em 15 de junho de 2025”, disse.
Para Fux, essa “disponibilidade tardia”, que chamou de “tsunami de dados” e comparou ao document dumping do direito anglo-saxão, impediu a atuação adequada dos advogados. “Confesso que tive dificuldade para elaborar um voto imenso”, afirmou.
O ministro também reiterou posição já manifestada de que o STF não teria competência para julgar o caso, já que, à época dos crimes imputados, nenhum dos réus possuía foro privilegiado.
Na véspera, Moraes rejeitou o argumento e sustentou que a anexação massiva de arquivos foi solicitada pelas próprias defesas, embora muitos documentos não tenham sido relevantes para a denúncia ou para a formação de juízo. Nos bastidores, colegas de tribunal ficaram surpresos, houve até o comentário de que a retórica de Fux caiu como uma luva nas mãos de Trump. Isso porque reforça a tese de que Bolsonaro estaria sendo vítima de um processo espúrio.
O jurista Lênio Streck em suas redes sociais avaliou que a questão da competência já está consolidada. “Não há como rever isso”, afirmou. Ele lembrou que Fux aceitou a tramitação no STF no recebimento da denúncia, ainda que alegando in dubio pro societate. “Agora, ele passou do in dubio pro societate para o in dubio pro reo. Além disso, por 7×4 o STF já definiu o foro”, destacou.
O in dubio pro societate é um princípio de direito penal que, ao contrário do in dubio pro reo, sustenta que em caso de dúvida sobre a autoria ou materialidade de um crime, a ação penal deve seguir em frente em benefício da sociedade, permitindo que as investigações se aprofundem para a resolução do caso.
Julgamento em andamento
A Primeira Turma do STF retomou nesta quarta-feira, 10, o julgamento iniciado em 2 de setembro. Até o momento, Moraes e Dino votaram pela condenação dos oito réus pelos cinco crimes imputados pela Procuradoria-Geral da República (PGR). A análise deve seguir até sexta, 12, com votos de Cármen Lúcia e Cristiano Zanin, presidente da Turma.
Réus do processo
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Jair Bolsonaro – ex-presidente da República;
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Alexandre Ramagem – ex-diretor da Abin e atual deputado federal;
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Almir Garnier – ex-comandante da Marinha;
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Anderson Torres – ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança do DF;
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Augusto Heleno – ex-ministro do GSI;
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Paulo Sérgio Nogueira – ex-ministro da Defesa;
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Walter Braga Netto – ex-ministro da Defesa e candidato a vice de Bolsonaro em 2022;
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Mauro Cid – ex-ajudante de ordens de Bolsonaro.
Acusações
Os réus respondem por organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.
No caso de Ramagem, a Constituição garante a suspensão de parte das acusações, restando apenas três crimes. Ele não responde pelos atos relacionados à depredação do patrimônio público em 8 de janeiro.

